terça-feira, 5 de outubro de 2010

Limusine,o que é isso?

    __ Mamãe, estamos com fome!
    __ Estudem só mais um pouquinho.  Enquanto isso, preparo um lanchinho bem gostoso pra todos nós.
    __ Oba! Mamãe,  você é demais! É dez!
    Flávio e Ricardo são amiguinhos de longa data. Estudam no mesmo colégio desde o prezinho e, agora, aos nove anos,  cursam o quarto ano de ensino fundamental.
    Terão avaliação de matemática no dia seguinte.  Helena, mãe do Flávio, é professora de matemática, mas não exerce a profissão no momento.  Os meninos estão resolvendo exercícios e problemas matemáticos.   E pra qualquer dúvida, lá está ela de prontidão pra ajudá-los.
     __ Crianças, podem vir.  Já está pronto o nosso lanche.
    Os meninos saem do escritório em disparada, derrubam uma cadeira, batem na mesinha lateral ao sofá grande, o vaso de cristal cheio de água e flores balança, balança e milagrosamente não cai.  Água escorre pela mesa, cai no chão e forma uma mancha no tapete persa de cor vermelha.  Coisas de moleque!
    Luiza, a filha de quatro anos, vem do quarto, onde brincava com as bonecas e se junta ao grupo esfomeado.
    Os olhinhos marotos e curiosos dos três percorrem as delícias expostas na mesa prontas pra serem devoradas: bolo de cenoura com cobertura de chocolate que Helena preparara no dia anterior, pãozinho de queijo bem mineiro, bolacha salgada, requeijão, suco de laranja e achocolatado.  Pra ninguém botar defeito.  As boquinhas salivam igual cachorro na frente de um belo pedaço de carne.
    Já acomodados, o assunto dos meninos gira em torno de carros de corrida.  No domingo anterior, estiveram em Interlagos acompanhados dos pais assistindo à Fórmula 1.
    Luíza gulosa e tagarelando sem parar,  encheu a boca com um pão de queijo inteirinho.
    __ Come devagar, Luíza. E não fale de boca cheia.
    É que Luíza tentava entrar na conversa dos meninos, mas era ignorada.
    __ Por que eu não fui com o papai a essa corrida?
    __Você é muito pequena e não estende nada de carro e de pista, retrucou Flavinho.
      Ela fez biquinho, carinha de choro e  ameaçou sair da mesa, mas Helena estava aí para por ordem nas coisas.
    __Pra compensar, minha filha, vou levá-la ao cinema no sábado.  Vamos assistir a "Alice no país das maravilhas.
    Luíza fica feliz e um sorriso largo e gostoso aparece naquela carinha bochechuda.  Linda como ela só.
      __ Ricardo, você viu a  revista de carros deste mês com os novos lançamentos do ano? Pergunta Flavinho.
   __ Ainda não.  Você tem?
   __ Claro. Papai compra assim que sai nas bancas.  Sabe, quando eu crescer, vou comprar uma Ferrai vermelha pra mim.  È tudo o que mais quero. 
    __Flavinho, você me leva pra passear? Pergunta Luíza na sua inocência.
    __ Vou pensar.  Se você for sempre boazinha pra mim...
    __ Mamãe, fale  pra ele me levar...
    Nessa altura, as vozes já estavam bem elevadas e Ricardo grita pra ser ouvido:
    __ Quando crescer, eu vou comprar uma Limusine pra mim.
    __ Mamãe, o que é "Lusine"?  Questiona Luíza.
    __ É Li-mu-si-ne. _ Flávio soletra bem alto. 
    __Papai já comprou um carro desse?
    __ Não Luíza, é um carro muito grande e muito caro.  Tá vendo como você não entende nada de carro?
    __ Flávio, entenda que sua irmã é apenas uma garotinha de quatro anos e muito esperta. Não quero ninguém gritando com ninguém.
    __ Ricardo intervém:
    __ A Limusine é tão grande, tão grande que dentro dela cabem muitas pessoas.  Tem frigobar, televisão a cabo, telefone fixo, CDplayer, MP3, MP4.  Maravilha!  É como se fosse a sala da gente quando recebemos visitas.
    Com carinha de espanto, a menina não desiste e pergunta:
    __ Isso existe de verdade, mamãe?  Como eu nunca vi?
    __ É verdade, sim. Existem poucas Limusines e poucas pessoas têm dinheiro pra comprar.  E quem compra, usa só em ocasiões especiais.
 Outro dia, numa revista especializada em carros especiais, li uma reportagem que falava sobre a maior Limusine do mundo.  Foi construída por um norte-americano, nos anos 90.  Ela tem mais de 30 metros de comprimento e 24 rodas.
    __ 24 rodas?  Maior que um caminhão que transporta cargas pesadas? __Questiona Ricardo, interssado no assunto.
   __ Isso mesmo.  Muito maior...       
   Essa Limusine nem pode circular pela cidade por conta do seu tamanho. Ela fica guardada na garagem.  __Explica Helena.
    __ O que tem a ver o tamanho, Dona Helena?  Eu não entendo por quê.  Ônibus também é grande
   __Mas essa Limusine é bem maior que ônibus. E com esse tamanhão, pode atrapalhar o trânsito e provocar congestionamento.  Já pensou estacionar uma Limusine na zona azul?  Ocuparia o espaço de nem sei quantos carros.
     Luíza fica pensativa e solta essa:
    __Grande coisa ter um carro desse!
    Flávio complementa:
   __  Agora você acertou, Luíza.  Carro é pra passear, viajar, divertir e não pra ficar guardado na garagem igual aquela boneca que voce nem tira da caixa... 
    __ A boneca é minha e eu faço o que quero com ela.
    __ Sabe, vamos parar com esse assunto.  Vocês terão  que comer muito feijão, crescer muito, estudar muito mais ainda até chegar o dia de cada um de vocês comprar um carro.  O papo   tá bom, vocês já estão de barriguinha cheia, vamos voltar aos estudos.  Vocês  dois têm ainda uma página inteira de exercícios pra resolver e eu quero corrigir todos.  Não se esqueçam: a avaliação é amanhã.
      Os meninos saem saltitando da mesa e Luíza volta ao quarto brincar com as bonecas.
      Enquanto Helena põe ordem na cozinha, seu pensamento viaja até o seu tempo de criança.   Sem perceber, pensa alto:
    __ Como é bom ser criança!   Com  pureza e ingenuidade, a criança transforma sonhos, os mais impossíveis,  em verdades num estalar de dedos.  Imagine só, quando menina, eu contava pra todo mundo que seria a primeira astronauta mulher a viajar pro espaço.  Em 1969, quando uma nave espacial americana desceu em solo lunar, eu fiquei quase louca de tanta emoção.  A partir daí, nunca mais deixei de ler jornais e revistas sobre o assunto.  Eeu não entendia porque todos riam de mim, apesar de concordarem com meu sonho.
    Luíza grita lá do quarto:
    __ Mamãe,  você está falando comigo?
    Esperou um pouquinho e como não obteve resposta, pé ante pé,  foi  até a porta da cozinha bem de mansinho,  ficou escondidinha, observando sua mãe, que continuava divagando:
    __Pena que não podemos parar o tempo.  O adulto complica demais coisas tão simples e pequeninas.
    __ Luíza resmunga baixinho pra não ser descoberta no seu esconderijo:
    __ Acho que a mamãe está ficando biruta, coitada.  Deu pra falar sozinha.  Papai precisa saber disso.  Ela está precisando urgentemente de um médico.
   
  
  
   
   
 

 
    __

   

Nenhum comentário:

Postar um comentário

HIRIS LAZARIN